Os portugueses dividem-se em dois géneros básicos: os enrascados e os desenrascados. Os primeiros dependem dos segundos, e os segundos dependem dos primeiros. É um ciclo vicioso (e viciado) que tem a sua inspiração, provavelmente, em Karl Marx.
Os desenrascados têm como função, ao contrário do que o nome sugere, enrascar os enrascados. Quando o conseguem, podem então fazer jus à sua característica predominante e então desenrascá-los. É ridículo, é La Palisiano, mas é verdade. Maquiavel era capaz de se baralhar no meio deste processo todo: aquela sua velha questão (ou postulado) onde os meios justificam os fins, adquire um carácter meio esquizofrénico aqui em Portugal. É que aqui, para um desenrascado, os meios são mesmo os fins. Enrascar é uma garantia de que vai ser necessário, a qualquer momento, mais tarde ou mais cedo, desenrascar.
Desenrascar, aqui nesta nossa telenovela mexicana, significa resolver um problema que não existiria se não tivéssemos pensado em qualquer coisa que nos pudesse enrascar. Passo a explicar:
Alberto tem uma máquina de lavar roupa. A máquina de lavar roupa tem um painel electrónico. O painel electrónico da máquina de lavar roupa de Alberto diz que já é altura de verificar o nível de calcário da máquina. Alberto liga para um canalizador para o desenrascar (pensa ele). O canalizador chega, abre a máquina de lavar roupa do Alberto, e enrasca-o. Uma semana depois a máquina, que está programada para electronicamente pedir uma revisão ao fim de um ano, deixa de funcionar. Alberto volta a ligar para o canalizador que o enrascou e pede-lhe para o desenrascar. É assim a vida neste país à beira-mar enrascado.
O problema é que este comportamento se repete nas mínimas coisas: votamos, enrascados numa crise económica causada em grande parte pelo partido que ganha eleições, para nos desenrascarmos e ainda nos enrascamos mais.
Ser português é andar à rasca e à espera que alguém o desenrasque. Há aqui uma espécie de demissão de responsabilidade a favor de alguém que ainda é mais irresponsável que nós. Fantástico, não é?
E acabei agora mesmo de desenrascar o post de hoje. Amanhã vou-me enrascar para escrever o próximo. Mas já sabem: podem sempre contar comigo para vos desenrascar.
terça-feira, novembro 21, 2006
A Razão de Desenrascar
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