Para mim a Opinião Pública é como a plasticina: com imensas cores diferentes e perfeitamente moldável.
Tem um problema também semelhante à plasticina - quando misturamos as várias cores e moldamos excessivamente, fica acinzentada.
O conto infantil que melhor retrata a história da humanidade é, sem dúvida, a História dos Três Porquinhos. Esta história simbolicamente divide o mundo em 4 tipos de gente, cada um dos tipos correspondendo a uma personagem:
- Temos os indigentes, representados por Cícero (o porco preguiçoso), que gostam pouco de alancar e preferem esticar a mão ao fim do mês e receber os subsídios do Estado.
- Temos os tipos que trabalham, trabalham e trabalham, representados por Heitor (o porco trabalhador), que nunca têm o seu esforço recompensado e que no final de cada mês vêem o seu dinheirinho escoar-se em impostos para pagar a inércia dos Cíceros deste mundo.
- Temos a malta inteligente, representada por Práctico (o porco construtor civil) que lá se vai safando com algum custo.
- E finalmente temos os gajos que querem lixar a vida a todos os outros (representados pelo Lobo Mau) e que, trabalhando afincadamente para o Estado (essa abstracção incómoda) acabam inevitavelmente por lixar os Cíceros e Heitores da vida.
O conto contém requintes de malvadez: as personagens consideradas «boazinhas» são uma vara de porcos, o que não abona muito a favor de todos nós. Todos têm um nome próprio à excepção do lobo que, tal como o Estado, não é personalizável. Quem é esperto dedica-se à construção civil à séria. E o Estado é representado por um predador insistente e sem escrúpulos (um silogismo, portanto).
A história só não é perfeita porque um dos porcos acaba por se safar à conta de um trabalho bem feito e de uma criteriosa escolha de materiais de construção. É aqui que tudo entra no mundo das fábulas, porque sabemos bem que no mundo real o porco nunca teria este discernimento profissional e veria a sua obra embargada sine die para mais tarde ser implodida com pompa e circunstância ou, na melhor das hipóteses, untava as mãozinhas do lobo e de todos os seus colegas de partido para evitar ser envolvido numa escandaleira qualquer envolvendo práticas esquisitas com leitõezinhos e tâmaras frescas.
Ainda assim fica o registo de uma boa tentativa para nos retratar.
Tenho um problema com as festas de casamento. Primeiro porque não percebo porque raio dois seres acham que o facto de terem decidido viver juntos «para o resto das suas vidas» constitui motivo de celebração, e depois por todos os rituais bacocos que envolvem a festa, e que fazem com que as festas de casamento se assemelhem às bolas de ténis: quem vê uma vê todas. E por isso mesmo, sempre que vou a um casamento é como se estivesse a ver pela enésima vez o mesmo filme, só mudando os locais de filmagem, e claro, as personagens.
Ao longo de anos como convidado de festas de casamento criei uma pequena check list virtual que uso para me entreter e passar o tempo em cada celebração matrimonial. Como o argumento é sempre igual de festa para festa, a check list é dolorosamente implacável a assinalar «os pontos altos» de cada uma.
Não pretendendo ser exaustivo (a minha lista é verdadeiramente longa e diversificada, ombreando com qualquer modelo de análise multivariada) vou partilhar convosco os items mais comuns:
Na Igreja
Para quem conseguiu escapar à gloriosa tarefa de ter que começar a festa a enfardar na casa de um dos noivos antes de o acompanhar no seu trajecto ao altar, a Igreja é o grande início da festa do casamento e apresenta per si um rico manancial de rituais:
- O Freakshow – continuo a achar esta parte a mais interessante porque em cada casamento há sempre uma bela molhada de seres esquisitos (amigos e familiares dos noivos) que nós nunca vimos antes e que dão um colorido peculiar à cerimónia, com os seus fatos a cheirar a naftalina (invariavelmente dois números acima ou abaixo da medida do seu utilizador); os sapatos encerados de modo a encandear toda a tripulação de um boeing que passe por ali perto; os vestidos mais inexplicáveis com decotes e minissaias generosas sustentadas por saltos agulha que dificultam o andar no chão empedrado da igreja. Na fase de freakshow os mamíferos presentes trocam olhares e cochichos, medindo-se timidamente uns aos outros, avaliando as suas respectivas figuras tristes.
- O Sermão e as Leituras – onde por breves momentos toda a gente parece ter o dom da leitura, recitando aqueles repetitivos «discursos de São Paulo aos etruscos», ouvindo-se aqui e ali um choro de criança a ser levada rapidamente para fora da igreja por um dos seus sádicos pais. Se tivermos sorte, o que é raro, o padre é breve e contido e poupa-nos meia hora de seca a falar da incerteza dos dias de hoje, da crise das instituíções e da própria família, e da escassez de crentes praticantes abaixo dos 65 anos.
- O Arroz – o discurso do padre ditará a violência com que se atirará o arroz aos noivos. Se o padre nos deu uma seca, o mais provável é que pelo menos um dos conjuges nunca consiga recuperar totalmente de uma perfuração da retina.
- O Cortejo Automóvel – já vi carrinhas funerárias deslocarem-se mais depressa que um cortejo automóvel num casamento, o que torna a chegada ao Copo D’Água um verdadeiro suplício, principalmente durante a época de Verão. De salientar aqui dois aspectos: os carros estão sempre imaculados e reluzentes; e um grupinho de labregos irá invariavelmente perder-se do cortejo chegando muito depois dos petit fours.
Vou omitir propositadamente a parte das fotografias e das filmagens, porque geralmente não têm grande interesse na altura (embora saibamos que vamos ter de levar com elas mais tarde, quando os noivos chegarem da Lua de Mel).
É considerada a segunda parte do filme, e aquela que apresenta variantes mais ricas. Digamos que a verdadeira festa começa realmente aqui.
- Os Petit Fours – ao chegarmos ao local do Copo D’Água somos presenteados com petit fours e aperitivos vários. Começa assim a verdadeira maratona de bebida e comezaina, havendo alguns convivas que ficarão alegremente etilizados nesta fase em estágio para a verdadeira bebedeira que se desenrolará a seguir, em todo o seu esplendor. Nesta fase o nível de álcool faz com que os convivas comecem a socializar entre si, perdendo alguma inibição inicial.
- O Arremesso do Bouquet – um momento crítico para as encalhadas de serviço a qualquer casamento. Já quentinhas com os aperitivos, este ritual assume um carácter de «vida ou morte» para cada uma das participantes, podendo originar traumatismos graves dependendo do grau de desespero das intervenientes.
- A Refeição Principal – aparte da velocidade com que a comida e a bebida desaparecem nesta fase, pouco há salientar, tirando talvez o ritual do bater em uníssono com um talher no copo, na tentativa de que os noivos se beijem. Existem variantes deste ritual, muito mais interessantes aliás, onde os convivas exigem que o pai da noiva beije violentamente a mãe do noivo (a maior parte das vezes sem qualquer sucesso aparente).
- O Charuto – como fumador habitual de habanos divirto-me a observar os mamíferos do sexo masculino a fumar o tradicional charuto depois da refeição principal. É impressionante a figura urso que se pode fazer a fingir que se sabe fumar charuto. Gosto particularmente do free style de espetar um palito pelo charuto adentro de modo a segurá-lo na boca trincando apenas o palito. São uns artistas.
- O Bailarico – na minha modesta opinião, o ponto mais alto da festa matrimonial. Nesta altura eles e elas perderam a compostura, desapertaram as gravatas, subiram as mangas e as saias, baixaram os decotes e dançam (muitas vezes descalças) como se não houvesse amanhã, fazendo de quando em vez um pequeno comboio de bêbados que circula por entre as mesas do recinto. Valentes trambolhões são coisa normal nesta fase, havendo variantes mais excitantes que envolvem cenas de desenfreada pancadaria entre maridos ciumentos na defesa das suas etilizadas e ziguezagueantes esposas, apalpadas sem dó nem piedade por indivíduos que ultrapassaram, em muito, os limites legais de consumo de substâncias entorpecentes.
- O Cortar do Bolo – é normalmente arrastado até ao último minuto possível por se saber que, depois dele, mais de metade dos convivas baza alarvemente dali para fora. Eu incluído (antes de dar a segunda dentada naquela fatia gigantesca e sensaborona já estou ao volante do carro para me pirar).
- A Ceia e o Pós Ceia – confesso a minha total falta de experiência nesta fase. Mas segundo me dizem é aqui que se inicia o próximo casamento, dado que são normalmente os encalhados que resistem até à Ceia na tentativa de desencalharem de uma vez por todas. A bebedeira normalmente baixa-lhes a fasquia dos critérios o que lhes abre uma possibilidade, mesmo que remota, de encontrarem (no mesmo estado etilizado) a «pessoa do resto das suas vidas».
O recém chegado Papa Bento XVI convocou, no início do ano, uma comissão de trinta teólogos com o objectivo de acabar com o Limbo. Para quem está menos informado sobre a arquitectura do edificio celeste, o Limbo é aquele andar entre o Céu e o Inferno, para onde vão as almas de todas crianças, bébés e fetos que morrem sem que tenham sido baptizados. O Limbo, que existia desde o século IV, altura em que São Gregório, o Teólogo, decidiu construir uma mezzanine no Inferno, passou a ser levado a sério depois de umas obras de restauro levadas a cabo por São Tomás de Aquino no século XIII, altura em que ganhou um estatuto de assoalhada (muito embora o seu pé direito fosse muito reduzido, dado que foi espaço ganho ao inferno, nunca ninguém se preocupou muito com isso porque as crianças nunca atingiam alturas acima do metro e meio). No início do século passado, o Papa Pio X garantiu a pés juntos que o Limbo existia e que as almas das crianças não baptizadas estavam lá – tendo apresentado na altura vários dossiers com os nomes e idades dos residentes.
A existência do Limbo nunca foi pacífica, dado que era considerada um regime de apartheid celestial: uma criança índia que nascesse e morresse no meio da selva sem nunca ter ouvido a Palavra do Senhor (muitos consideram que essa palavra é «rabanete», embora ninguém esteja muito certo disso, havendo uma escola mais radical que afirma que a palavra é «zingarelho») nunca teria possibilidade de chegar ao Céu, e o mais que podia era candidatar-se a um lugar no Limbo, simplesmente porque o canal de distribuíção da Igreja não fazia entregas naquela zona da sua selva. Uma escandaleira discriminatória, como bem se vê.
Foi exactamente este princípio de apartheid que levou o Papa Bento XVI a rever a existência do Limbo e a iniciar a sua extinção, o que irá tornar as coisas mais complicadas doravante uma vez que, sem o Limbo, os católicos e os membros de uma série de outras religiões irão concorrer em pé de igualdade por vagas nos mesmo lugares – Céu, Inferno e Purgatório. E sabe Deus como estes dois últimos estão lotados...
Entretanto os 30 teólogos estão reunidos à procura de soluções para acabar com o Limbo e realocar aquelas alminhas. Espera-se que na próxima sexta-feira apresentem ao Papa um pacote de medidas, que terei oportunidade de revelar em primeira mão, aqui na Razão.
Os apóstolos ainda tentaram fazer um brainstorming, com os conhecimentos adquiridos até à data, de modo a conseguirem chegar a algo que se assemelhasse ao que eles achavam que seria a Palavra do Senhor, mas tirando aquela cena da ressuscitação (onde todos estavam de acordo que era uma história do caraças e que merecia ser contada), não conseguiram chegar uma conclusão sobre qual seria a Palavra do Senhor. E assim cada um deles foi à sua vida escrever e pregar sobre a sua visão de Deus e de Jesus, e cada um deles achou que sabia qual era a Palavra do Senhor.
Pedro, João e Tiago (o Maior) achavam que a Palavra do Senhor era «rabanete». Chegaram a esta conclusão depois de terem proferido uma série de outras palavras. Na altura em que proferiram «rabanete» aconteceram umas coisas esquisitas: a terra tremeu, a garrafa de vinho caiu de pé, e os cães começaram a uivar. E a partir daí, desconhecedores da escala de Richter, acharam que tinham descoberto a Palavra.
Filipe, Bartolomeu e Tomé haviam decidido que a Palavra era «Oréops!», mas só porque gostavam da sua sonoridade, dado que não há qualquer registo que algum fenómeno natural tenha ocorrido quando esta foi inicialmente pronunciada. Tomé era aquele que a usava mais, principalmente quando treinava o seu triplo salto encarpado de costas, nas margens do Mar Morto.
Tiago (o Menor), Mateus e Judas Tadeu, eram apologistas fervorosos da Palavra «Porra», a última palavra que ouviram da boca de Jesus. Achavam que não era uma simples interjeição nascida da sua inconfortável posição na cruz. Acreditavam piamente que se aquela foi a última palavra de Jesus, é porque aquilo devia ter um segundo sentido qualquer. Um sentido celestial.
Finalmente, os dois apóstolos mais radicais, André e Simão tinham «zingarelho» como a verdadeira Palavra do Senhor. Tinham-na ouvido da boca de Maria Madalena quando pela primeira vez recorreram aos seus serviços. Ela apontou para as tripas de porco e disse-lhes: «ponham lá os zingarelhos, que isto não é da Joana». Depois dos zingarelhos postos Maria Madalena deu-lhes uma experiência celestial que eles nunca mais esqueceriam. E desde aí a Palavra do Senhor passou a ser um grande «zingarelho». Bem... no caso de Simão nem era tão grande como isso.
Não vos causa estranheza a designação «testemunha presencial»? O que é que isto é suposto definir: um tipo que estava fisicamente presente num local onde se deu uma ocorrência, não? Ora isto significa que quem não estava fisicamente naquele local quando se deu a concorrência é uma «testemunha não presencial». Cheguei à conclusão que sou uma testemunha não presencial de milhares de atrocidades e isso deixa-me preocupado. É que esta condição de testemunha não-presencial coloca-me na eminência de qualquer dia ser intimado a comparecer num qualquer tribunal algures no mundo, para testemunhar não presencialmente um crime qualquer, o que convenhamos não dá muito jeito, principalmente se tiver que fazer várias escalas.
A outra designação dúbia é «testemunha ocular». Isto supostamente define alguém que é uma testemunha presencial e que ainda por cima viu tudo o que se passou em determinada ocorrência. Ser «testemunha presencial» não é o mesmo que ser «testemunha ocular»? Ou também há «testemunhas auriculares»? Curiosamente nunca ouvi ninguém falar nas testemunhas auriculares, aqueles tipos que estão no lugar da ocorrência mas que por qualquer motivo não olham para ela. Não olham, pronto. Não gostam de olhar para aquelas porcarias. Mas ouvem. Ouvem tudo. Não serão estes gajos testemunhas auriculares?
Isto leva-me a pensar que podem existir «testemunhas não presenciais auriculares»: tipos que estão longe da ocorrência mas que conseguem ouvi-la. Esses tipos são considerados legítimos? Mesmo que o pai seja incógnito? Não faço ideia.
Mas onde a coisa se baralha mesmo é com aqueles gajos que estão longe da ocorrência e no entanto estão a olhar para ela com um par de binóculos. São as «testemunhas binoculares». Estes nem são presenciais nem auriculares (porque estão longe demais para ouvir o que quer que seja). Poderão estes gajos ser levados a sério num tribunal? Espero bem que não. É que eu todas as noites sou testemunha binocular das excêntricas actividades nocturnas de uma vizinha jeitosa, e não me dá jeito nenhum ir parar a um tribunal.
Há uns tempos atrás o Zé Maria, aquela alma simples do Big Brother, tentou suicidar-se, depois de ter estoirado o dinheiro que ganhou no concurso em projectos falhados.
Marco, o neanderthal do pontapé maravilha do Big Brother, foi detido pela polícia no ano passado, acusado por um camionista de agressão selvática e persistente numa fila de trânsito.
A semana passada li que o Mário, o loiro burro do Big Brother, foi preso pela judiciária, acusado de liderar um gang responsável por assaltos à mão armada na zona do Porto.
A julgar pelos exemplos acima, os reality shows serão largamente responsáveis por toda uma geração de anormais desajustados e destrambelhados, com a mania das grandezas e do sucesso fácil. Não falo só dos anormais que por lá pululam, mas também dos anormais que diariamente enchem as audiências deste tipo de programas.
Parece-me óbvio que os reality shows dão cabo da vida pública dos seus participantes, que consequentemente passam a lidar muito mal com isso nas suas vidas privadas. Ora se assim é, porque não assumir as coisas frontalmente e criar programas que arrebentam com a vida dos gajos logo ali em directo, à vista de toda a gente, em vez dos abandonar à sua sorte no fim de cada programa? Seria infinitamente mais honesto do que acontece agora. E geraria muito mais audiência.
Foi a pensar nisto que elaborei algumas ideias passíveis de serem utilizadas pelo Piet Hein, free of charge, nos seus futuros lixos televisivos:
O Atol
Um grupo de labregos é colocado num atol de Mururoa. São formadas equipas de dois elementos e a cada indivíduo é dado um componente de uma bomba nuclear de potência desconhecida. Cada elemento da equipa é colocado num ponto do atol, bem distante do seu companheiro de equipa. O objectivo é encontrarem-se o mais rapidamente possível, juntando os componentes da bomba e accionando o dispositivo. Vence quem conseguir destruir o atol primeiro. Prémio de 100.000 euros para os primeiros, que será doado à TVI se os participantes não se apresentarem nos escritórios do Piet Hein duas horas depois de finalizada a prova.
Um grupo de quarentonas encalhadas é largado na selva ardente à mercê de uma tribo de somalis devidamente untadinhos e com a testosterona alterada quimicamente de modo a não pensarem noutra coisa que não seja a sodomia brutal e persistente.
Ao fim de três meses as quarentonas serão recolhidas e a vencedora será aquela que ostentar um caminhar mais esquisito.
Um reality show com anões, cavalos pentapérnicos, e mulheres desnudas, que tem características próximas do triatlo olímpico.
Os anões são inicialmente catapultados para dentro de campos de minas, que terão que atravessar até chegar aos cavalos pentapérnicos. Os que sobreviverem à queda e às minas terão que cavalgar 20 km num campo de urtigas e espinhos, agarrados à quinta perna do cavalo. Os que conseguirem transpôr a segunda fase da prova serão de novo catapultados para o campo de minas. As mulheres desnudas na realidade não existem, e são apenas um motivo para dar cabo dos anões. O anão que sobreviver estará automaticamente apurado para «O Atol».
O Cartoon
Destinado a toda essa malta com talento para o desenho que anda por aí. Doze cartoonistas são fechados numa sala blindada com um fundamentalista islâmico que, embora ninguém saiba porque não se vê, está atestadinho de explosivos na zona rectal. Os cartoonistas têm que desenhar temas religiosos alusivos ao Ramadão. Quem conseguir fazer explodir o árabe ganha umas próteses biónicas (último modelo) para os bracinhos.
Reality show que simula o interior de uma repartição pública. A cada um dos quinze participantes é facultado: uma máquina de escrever Remington de 1916, trinta resmas de papel pautado, cinco resmas de papel químico, uma caixa de lexotans. Vence quem conseguir levar mais tempo a deferir um processo. O premiado será catapultado para o campo de minas dos anões. Os restantes irão servir de figurantes em «O Atol».
Sabemos que um blog só é verdadeiramente um blog quando resiste à barreira dos quatro meses – duração convencionada, por não sei quem, para o fim da maioria dos blogs. É verdade. Sempre que se cria um blog, o mais certo é que a sua esperança de vida seja de quatro meses. Isto significa que a maioria das pessoas só tem quatro meses de coisas para dizer. Pena que isto não aconteça também na política.
Isto para dizer que a Razão entra hoje no seu sexto quarto mês de existência, cumprindo o seu segundo aniversário. Com muito menos para dizer do que há dois anos atrás, é certo. Mas ainda assim com muita barbaridade por escrever. Quanto mais não seja para contrariar a convenção dos quatro meses. Odeio convenções. Aborrecem-me.
Para assinalar o 2ºaniversário do blog, esta semana irá ser dedicada à republicação dos meus posts preferidos do ano que passou. Acabei de dar uma semana de férias a mim próprio. ;-)
Em 25 de Abril de 1974 os militares, insatisfeitos, tomaram o poder.
Hoje os militares, insatisfeitos, «passeiam organizadamente».
Estamos a ficar moles.
Os portugueses dividem-se em dois géneros básicos: os enrascados e os desenrascados. Os primeiros dependem dos segundos, e os segundos dependem dos primeiros. É um ciclo vicioso (e viciado) que tem a sua inspiração, provavelmente, em Karl Marx.
Os desenrascados têm como função, ao contrário do que o nome sugere, enrascar os enrascados. Quando o conseguem, podem então fazer jus à sua característica predominante e então desenrascá-los. É ridículo, é La Palisiano, mas é verdade. Maquiavel era capaz de se baralhar no meio deste processo todo: aquela sua velha questão (ou postulado) onde os meios justificam os fins, adquire um carácter meio esquizofrénico aqui em Portugal. É que aqui, para um desenrascado, os meios são mesmo os fins. Enrascar é uma garantia de que vai ser necessário, a qualquer momento, mais tarde ou mais cedo, desenrascar.
Desenrascar, aqui nesta nossa telenovela mexicana, significa resolver um problema que não existiria se não tivéssemos pensado em qualquer coisa que nos pudesse enrascar. Passo a explicar:
Alberto tem uma máquina de lavar roupa. A máquina de lavar roupa tem um painel electrónico. O painel electrónico da máquina de lavar roupa de Alberto diz que já é altura de verificar o nível de calcário da máquina. Alberto liga para um canalizador para o desenrascar (pensa ele). O canalizador chega, abre a máquina de lavar roupa do Alberto, e enrasca-o. Uma semana depois a máquina, que está programada para electronicamente pedir uma revisão ao fim de um ano, deixa de funcionar. Alberto volta a ligar para o canalizador que o enrascou e pede-lhe para o desenrascar. É assim a vida neste país à beira-mar enrascado.
O problema é que este comportamento se repete nas mínimas coisas: votamos, enrascados numa crise económica causada em grande parte pelo partido que ganha eleições, para nos desenrascarmos e ainda nos enrascamos mais.
Ser português é andar à rasca e à espera que alguém o desenrasque. Há aqui uma espécie de demissão de responsabilidade a favor de alguém que ainda é mais irresponsável que nós. Fantástico, não é?
E acabei agora mesmo de desenrascar o post de hoje. Amanhã vou-me enrascar para escrever o próximo. Mas já sabem: podem sempre contar comigo para vos desenrascar.
Há muitas coisas que podem provar que o ser humano não é inteligente. Mas a minha preferida foi a necessidade de inventar o capacete. Aparentemente, o que estava a acontecer é que estávamos envolvidos em muitas actividades que nos estavam a partir a cabeça. Optámos por não deixar de as fazer e, em vez disso, inventar uma coisa que nos permitisse manter o estilo de vida que estava a partir-nos a cabeça. O capacete. Mas nem mesmo isso funcionou, porque havia muita gente que não o usava e então foi necessário fazer uma lei que tornasse o uso do capacete obrigatório. O que é ainda mais estúpido é a ideia de se fazer uma lei que obrigue as pessoas a preservarem um cérebro cujo discernimento é tão pouco que nem sequer tenta impedir que se parta o crânio que o protege.
Jerry Seinfeld
Para os mais distraídos podem não existir diferenças e parecer tudo a mesma coisa, mas não é. O taxista de aeroporto tem um património genético diferente do vulgar taxista. Algures no processo de evolução do taxista houve um ramo que foi afectado pela síndrome do funcionário público e que ditou o nascimento de uma nova estirpe, com um QI mais modesto, que reúne o pior do que podemos encontrar dentro de um táxi.
O taxista de aeroporto tem particularidades inimagináveis para os taxistas vulgaris. A sua principal característica reside no facto de não conceberem que se possam apanhar clientes fora do aeroporto. É algo que não lhes passa pela cabeça. Para um taxista de aeroporto, os clientes nascem de dentro dos aviões e é absolutamente impensável apanhá-los no meio da rua ou numa vulgar paragem de táxis dentro da cidade. Por isso mesmo, a vida de um taxista de aeroporto reveste-se de um carácter rotineiro onde cada dia começa e acaba, invariavelmente, no terminal de aeroporto.
Ao contrário do taxista vulgaris, o taxista de aeroporto sai do seu carro quando apanha um cliente. Cada início de bandeirada tem um ritual muito próprio que consiste em sair do carro, abrir o porta-bagagens, e ficar especado a olhar bovinamente para o cliente que, de vértebras comprimidas, se esforça a arrastar as suas pesadas malas para dentro do táxi.
Por razões que ainda ninguém conseguiu explicar até hoje, o taxista de aeroporto tem uma obsessão doentia com grandes distâncias, e torna-se ainda mais bruto se a bandeirada consiste apenas em meia dúzia de quilómetros para além do aeroporto. Na óptica do taxista de aeroporto, se um tipo apanha um táxi no aeroporto tem que fazer, pelo menos, uma bandeirada de 300 km que justifique e financie o facto de este ter estado três horas a coçar a micose numa fila de táxis num terminal de aeroporto. Explicar-lhes que, se quiséssemos viajar para 300 km dali mais valia termos voado para outro aeroporto é tempo perdido, porque para um taxista de aeroporto não existe outro aeroporto. Só aquele. O dele.
Outro raciocínio complexo do taxista de aeroporto está relacionado com a dimensão e número de malas que os clientes têm. Para ele, o número e a dimensão das malas estão inexplicavelmente relacionadas com a distância a percorrer: se tivermos muitas malas e grandes é vulgar que o taxista de aeroporto ache que vai percorrer o país connosco; se tivermos apenas uma mala de cabine ele olhar-nos-à com uma desconfiança abrutalhada enquanto cumpre o ritual de abrir o porta-bagagens. Para um taxista de aeroporto ninguém pode ir muito longe com uma mala de cabine.
Ao contrário do taxista vulgaris, um filósofo da bandeirada que nos quer convencer de qualquer coisa o tempo todo embrulhando cada trajecto numa conversa interminável, o processo da fala de um taxista de aeroporto é complexo e está directamente relacionado com a distância que lhe é solicitada para percorrer: se a bandeirada tiver menos de 5 km ele só consegue bufar e abanar a cabeça; se a bandeirada se situar entre os 5 e os 10km ele grunhe pontualmente ao longo do trajecto; se a bandeirada estiver acima dos 10km ele não emite qualquer som, embora apresente uma postura rígida que se assemelha a um cherne com 3 semanas de congelador. Há quem diga que, a partir do quilómetro 50, o taxista de aeroporto consegue pronunciar um conjunto de palavras que se assemelham vagamente a português, mas isto ainda está por provar.
Finalmente, falemos do espírito de matilha. Os taxistas vulgares têm-no. Os taxistas de aeroporto não. A pior coisinha para um taxista de aeroporto é outro taxista de aeroporto. Parado horas intermináveis no terminal, numa fila de táxis, o taxista de aeroporto fixa toda a sua bilis no colega do carro da frente. Com a certeza absoluta que «aquele filho da puta vai apanhar um gajo que quer viajar por Portugal inteiro numa única bandeirada», e que ele inevitavelmente apanhará um cliente para a próxima rotunda. Depois de horas e horas a consumir-se nesta lenga lenga ácida eis que, tenso e prestes a rebentar, se dirige para o cliente que lhe coube na fila e que lhe diz: «É para a próxima rotunda, segunda entrada, se faz favor».
Há vidas muito tristes.
No que toca a esquemas, os portugueses são imbatíveis. Não há povo no mundo que consiga produzir tanto esquema em tão poucos quilómetros quadrados. Se estão a pensar nos brasileiros, esqueçam: apesar de terem aprendido connosco a arte e de serem mais 140 milhões do que nós, não nos chegam aos calcanhares quando analisamos a quantidade de esquemas per capita.
Tudo o que acontece em Portugal faz parte de um esquema qualquer, iniciado por alguém, para lixar outrem. Quando olhamos à nossa volta, é impressionante a quantidade e variedade de esquemas que diariamente nos passam pela frente. Temos esquemas que chegam todos os dias às páginas do jornais, e quando isso acontece sabemos que se tratam de esquemas mal feitos, porque os esquemas bem feitos e bem montados são como os crimes perfeitos: ninguém os topa.
Estamos tão habituados a viver neste esquema que já não ligamos para a maior parte dos esquemas. É como se fizessem parte do esquema. São os chamados esquemas habituais. Acontecem tão naturalmente como o ar que respiramos e, não alinhar neles, é capaz de nos sufocar.
Temos também os velhos esquemas. Aqueles esquemas bafientos e instituídos que, quando denunciados pela comunicação social, acabam por se tornar esquemas manhosos e são substituídos por esquemas mais modernos.
A dimensão dos esquemas também é importante nesta telenovela mexicana: normalmente quem está envolvido em grandes esquemas e é apanhado, goza de uma espécie de glorificação bacoca e sai normalmente impune do esquema – o que leva a crer que há uma espécie de respeito e admiração velada e boçal por quem é um grande esquemático. Aqui, neste rectangulozinho, é prestigiante enganar muita gente. Ao contrário, o pequeno esquema (também designado por esquemazinho) é altamente penalizado. O lema parece ser «se roubares, rouba com estilo e em grande».
Temos finalmente uma classe de esquemas que parecem estar directamente relacionados com a necessidade de protagonismo mediático que os portugueses de classe média têm vindo a desenvolver na última década: são os esquemas marados (também designados por esquemas dos caraças). O objectivo destes esquemas é dar nas vistas, tentando assemelhar-se aos grandes esquemas, numa tentativa vã e desesperada de poderem ser considerados inteligentes, com o decorrente prestígio que daí advém. É claro que isto só denota a estupidez atávica de quem os cria – é tido e sabido que um esquema, para ser grande, tem que ser acima de tudo muito discreto. E os esquemas marados têm invariavelmente a discrição de um elefante numa loja de cristais...
Estão a ver o esquema?
Millôr Fernandes
Se há coisinha que eu acho mesmo nobre é uma bela causa. Lutar por uma causa é uma coisa mesmo bonita, principalmente quando olhamos para o tipo de causa.
Também acho piada ao lado estético das causas: são as chamadas boas causas. E sabe Deus como há causas boas como o milho...
Mas o tipo de causas que mais aprecio são as causas maiores. Haverá causa mais nobre do que a causa maior? Duvido. Não há causa que despolete mais efeito que a causa maior. Principalmente aquelas mesmos grandes, acima do metro e oitenta. Aquilo é causa que nunca mais acaba. Tem uma extensão tão sublime que por vezes, para muito boa gente, até se confunde com as boas causas.
Já as causas menores dispenso: considero-as quase invariavelmente uma espécie de pedofilia intelectual.
Porque não ser parvo? Um parvo praticante e diplomado. Ou, se tiver competência para isso, um PPE, Parvo Público Encartado. Pode não parecer quando olha à sua volta, mas não há parvos que cheguem no nosso país. Como resultado disso, pode ganhar-se muito dinheiro com a parvoíce. O parvo médio ganha pipas de massa por ano, mais regalias. E há vagas para parvos em todos os sectores: o governo é gerido por parvos, as grandes empresas são geridas por parvos e o comércio está a abarrotar de parvos. E cada vez mais pessoas enveredam por uma carreira de parvo freelancer. Ligue já para o Instituto Técnico da Parvoíce e receba o nosso panfleto gratuito «Ei, parvalhão, aprende a ser parvo a sério!» A maior parte das pessoas consegue ser parva em festas mas esta é a sua oportunidade de ser um parvo a tempo inteiro e durante todo o ano. Ligue-nos. Não se faça de parvo, seja um parvo.
Na Alemanha rebentou uma escandaleira que envolve um grupo de soldados alemães que fazem parte do contingente da ONU no Afeganistão. Os soldados deixaram-se fotografar posando alegremente para a câmara com um crânio numa mão e um pénis na outra. Os media alemães, para não enervarem os sempre enervadinhos árabes, dizem que os soldados profanaram um cadáver de um soldado russo, morto em combate nos anos 80. Confesso que não percebo como é que um cadáver de um gajo que morreu há quase 20 anos apresenta um crânio completamente desprovido de carne e um pénis não decomposto, mas desconfio que se deve a algo que os russos punham na ração de combate dos seus soldados.
Mas o que realmente interessa nesta história não é o mistério da mumificação selectiva e sim a violenta reacção dos orgãos oficiais alemães, ao questionável comportamento dos seus soldados. A reacção mais preocupante vem de um senhor que foi antigo comandante da ISAF e que afirma que «a imagem positiva que os militares alemães sempre gozaram junto das populações locais poderá ser seriamente afectada».
Quando leio estas coisas só posso achar que, de facto, estes gajos continuam a ser os maiores caras-de-pau da Europa e que o seu recorrente complexo de superioridade teima em vir ao de cima. Esta malta esquece-se do que andou a fazer na Europa há duas gerações atrás. Esta gentalha acha que, 50 anos depois, toda a gente apagou da memória a «imagem positiva dos militares alemães», e a sua conduta selvagem e criminosa. Estes calhordas acham que, por os deixarem andar de armas na mão, a fazer parte dos contingentes da ONU, reabilitaram a sua imagem no mundo. Desenganem-se. Eu não me esqueço de vocês. E espero que o mundo também não.
Nunca vi ninguém a limpar uma igreja. Já tenho visto muita coisa mas nunca vi uma equipa de limpeza a trabalhar numa igreja, a aspirar e a varrer. A limpar o pó às imagens e a esfregar o altar. Sabem porquê? Consegui perceber o motivo. As igrejas não precisam de ser limpas porque Deus trata disso. É um milagre, o tipo de coisas que faz das igrejas, igrejas.
Funciona assim: depois de uma igreja ter sido construída, os proprietários esperam seis meses e espreitam lá para dentro. Se estiver limpa, ficam a saber que é uma igreja. Depois, é só preparar a grande inauguração. Desse dia em diante, nunca mais terão de a limpar. Não importa o tipo de lixo, imundície ou porcaria que os pecadores arrastem lá para dentro. O sítio fica sempre impecável. Mas, aqui entre nós, um bocado de limpa-vidros naqueles vitrais de vez em quando não fazia mal nenhum. Ajudava a realçar aquelas cores bonitas que usam para mostrar a tortura e o sofrimento dos santos.
Há uma coisa que eu não percebo nas pessoas com tendências suicidas. Tentam suicidar-se, por qualquer razão não conseguem morrer, e pronto. Deixam de tentar. Porque é que não continuam a tentar? O que é que mudou? A sua vida terá melhorado? Não, deve ter piorado, porque agora têm mais uma coisa em que falharam. E, para começar, é por isso que essas pessoas não têm sucesso na vida. Desistem com demasiada facilidade.
A minha sugestão é: os comprimidos não funcionam? Experimentem uma corda. Não conseguem pôr o carro a trabalhar na garagem? Mandem afinar o motor. Não há nada mais compensador do que atingir um objectivo que fixámos para nós próprios.
O homem, um animal, recebeu da natureza um cérebro imperfeito que lhe filtra umas poucas verdades metafísicas (a noção da morte, por exemplo) que o fazem totalmente infeliz. Enquanto isso os animais perfeitos – com um cérebro que lhes impede a consciência de qualquer sentimento não-animal – divertem-se à brava.
Da série «histórias mal contadas» temos hoje Pedro e o Lobo. A história de um rapazinho que gostava de dizer inverdades – um eufemismo político que significa que o rapaz era um miserável mentiroso, digno de uma tribo somali sem qualquer tipo de lubrificação afrodisíaca.
Conta a história que o rapaz, ostentando a função de apascentador de ovelhas na sua carteira profissional, manifestava uma fixação esquisita, de índole meramente sexual, no lobo que mantinha uma relação contra-natura com o capuchinho vermelho e sua avózinha. Pedro tinha, obviamente, problemas. Todas as suas tentativas de se inscrever no movimento gay lésbico bissexual e transgênero tinham sido indeferidas pelo facto da coisa não envolver animais. «Nem domésticos, nem selvagens» tinham-lhe sentenciado lá no posto de recrutamento do GLBT. Mas Pedro não se conformava com esta discriminação – se o movimento era tudo ao molhe e fé em Deus porque raio não incluiam animais? Desesperado, Pedro passava os dias a arrastar-se pelos bosques, gritando «Lobo, lobo!» na vã esperança de que o animal lhe aparecesse à frente (ou atrás).
Mas o máximo que Pedro conseguiu foi enervar o pessoal lá da aldeia. Sempre que ele gritava «Lobo» a malta pegava nas gadanhas e vinha, desaustinada, defender as ovelhas. Ao fim de alguns dias de repetidos falsos alarmes a populaça perdeu a paciência e, mesmo sem recorrer a uma tribo somali devidamente untadinha, presenteou Pedro com um andar diferente. Pedro gostou. Desde aí perdeu completamente o interesse pelo lobo, mas não se coíbe de gritar por ele de vez em quando. Principalmente naqueles dias em que sente muito sozinho.
As mulheres encaram a roupa de uma forma completamente diferente. Noutro dia estava numa loja a ver as mulheres a admirarem a roupa e reparei que elas não a experimentam – põem-se por detrás dela. Tiram um vestido do cabide e põem-no à sua frente. E tiram uma conclusão qualquer. Esticam uma perna para a frente e inclinam-se ligeiramente para trás. Devem precisar de saber:«se um dia eu só tiver uma perna e tiver uma curvatura de quarenta e cinco graus, o que hei-de vestir?»
Nunca se vê um homem fazer aquilo. Nunca se vê um homem tirar um fato do cabide, pôr a cabeça por detrás da gola e perguntar: «O que é que acham deste fato? Acho que vou levá-lo. Ponha aí uns sapatos ao fundo das calças para eu ter a certeza. E se fôr a andar? Mexa aí os sapatos, mexa aí os sapatos.»
«Quando o meu filho mais velho nasceu, no ano seguinte houve um aumento da natalidade do país.»
D. Duarte Pio em entrevista ao 24 Horas
Desta vez estabelece uma correlação fundamental entre a sua vida sexual e a dos portugueses, acreditando piamente (ou não se chame ele Pio) que as suas acções despoletam irreversíveis macro tendências na nação portuguesa. Uma vez que ainda ninguém lhe explicou as virtudes ergonómicas de uma guilhotina, resta-nos aproveitar a sua mitomania e colocá-la ao serviço do país, contribuíndo para as profundas transformações estruturais que o desgoverno de Sócrates já mostrou ser incapaz de resolver:
Se Duarte Pio começar a trabalhar ainda este ano, em 2007 acabará o desemprego em Portugal. Sugiro que alguém ofereça uma enxada ao homem porque o sector do primário deste país está a desaparecer.
Se Duarte Pio preencher a sua declaração de impostos até ao final deste mês teremos resolvido em Janeiro próximo o problemas das dívidas ao fisco com milhares de portugueses a entupir, em histeria monárquica, todas as repartições de finanças do país, pagando tudo o que tinham para pagar.
Se Duarte Pio não ficar doente na próxima década terá resolvido por várias gerações o problema da saúde em Portugal.
Se Duarte Pio continuar a andar a cavalo estará a contribuir para que, dentro de cinco anos, Portugal reduza em 70% as suas emissões de carbono para atmosfera e veja o seu parque automóvel reduzido a 1.500 unidades (os carros dos membros do governo e seus respectivos secretários). O Estado deixará de empochar o imposto automóvel, mas que se lixe: seremos o país mais ecológico do planeta a seguir ao Ghana.
Se Duarte Pio deixar de dizer barbaridades aos jornais, dentro de um ano deixaremos de ter imprensa escrita e os jornalistas passarão a dedicar-se a profissões mais edificantes, como a pesca do bacalhau nos mares do norte, por exemplo.
Frederico Pedrosa, perito do Instituto de Medicina Legal, negou que as manchas do pénis de Carlos Cruz possam, em erecção, chegar ao tamanho de uma moeda de um cêntimo, como disse uma das vítimas.
O lado interessante desta notícia não é a peritagem do Frederico Pedrosa mas sim o que esta sugere: aparentemente houve uma vítima de pedofilia que afirmou que o Carlos Cruz tinha manchas no pénis e que estas tinham «o diâmetro de uma moeda de um cêntimo». Vem-se agora a provar que a vítima não tinha razão nenhuma, o que provavelmente vai conduzir à impugnação do seu testemunho por falta de prova. Não interessa nada que Carlos Cruz tenha manchas no pénis – algo que é tão vulgar como ter impresso no pénis a última tentativa de romance de Margarida Rebelo Pinto. O que interessa é que a dimensão das manchas não corresponde milimetricamente à verdade. Aliás, se as manchas tivessem o diâmetro de moedas de dois euros a vítima estaria lixada na mesma porque, no fim do dia, o processo Casa Pia terminará, à conta destes pequenos expedientes de pacotilha, sem vítimas nem acusados, provando uma vez mais a ineficácia e o engajamento do sistema de justiça português.
Casapiano e casapiómano significarão, no fim desta fantochada digna da nossa telenovela mexicana, exactamente a mesma coisa. Para mal dos primeiros.
Abriu recentemente a época da caça e os caçadores andam preocupados porque há menos bichos para caçar do que no ano passado. Existem várias razões para este fenómeno:
A primeira delas costuma designar-se por «é a caçadeira, estúpido» e está directamente relacionada com o caçador que hoje se indigna de não haver caça. Aparentemente, os caçadores não têm percepção da correlação entre a quantidade de bichos que matam e a quantidade de bichos que sobram. Aliás, a incapacidade de correlacionar seja o que fôr (um dos barómetros do nível de inteligência) é fraca junto dos caçadores. Um coelho bravo adulto consegue correlacionar mais dados que um caçador. Já a perdiz demonstra mais dificuldade nesta matéria. Mas isso não interessa nada agora.
A outra razão prende-se com o custo de vida e a deterioração das condições de trabalho que, como sabemos, têm vindo a piorar em Portugal. Os bichos portugueses não só têm a noção que a sua vida custa cada vez menos por aqui, como não têm condições para trabalhar num país que, de ano para ano, incendeia alucinadamente milhares de hectares de mata e floresta, tornando impossível a educação básica das suas crias: como ensinar uma cria a esconder-se em terreno aberto? Impossível. Rejeitando a hipótese de se tornarem alvos fáceis, os bichos têm emigrado massivamente para a vizinha Espanha onde, apesar das dificuldades da língua, vêem a sua esperança de vida aumentar drasticamente.
Finalmente, aquela que parece ser a razão estrutural para a gradual falta de caça em Portugal, temos a «Síndrome de Sócrates» (exactamente o oposto da «Síndrome de Estocolmo»). Desde que José Sócrates está no poder que o número de bichos tem vindo gradualmente a baixar. É que nem os bichinhos gostam...